quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

O betão resolve!

Ora aqui está um começo pouco auspicioso... Quando se compara o Estado Português ao Sporting já se sabe que o resultado é inquestionavelmente desastroso (é ver a classificação da 1ª Liga e, para os mais cépticos, esperar pelos resultados do défice e da evolução económica).

A crise mundial não é novidade, já tem mais de um ano e já todos estamos cansados de ouvir falar nela. Mas em abono da verdade, acho que na sua maioria os portugueses ainda não a interiorizaram. Não é que não achem que estamos em crise, simplesmente não parece é diferente da crise em que andamos vai para muitos anos.

Desde que me lembro por gente que se fala em crise (excepto no tempo das vacas gordas do Eng. António Guterres que andou a gastar por conta), estamos sempre em situação critica, sempre à beira de sofrer sanções da UE e as palavras "apertar o cinto" e "o país está de tanga" têm lugar cativo na boca dos nossos governantes. E em todos esses momentos a estratégia foi a mesma: "vamos estimular a economia com uma sucessão absurda de obras publicas"! Ok, admito que há 15 anos atrás de facto haveria muita obra para ser feita, e agora, de tempos a tempos há grandes obras que são úteis e fazem sentido para o desenvolvimento do país, então e as outras? Bom, as outras não sei...
Quando pensamos em 3 auto-estradas para o norte em que muitos dos troços são em paralelo, que sentido é que elas fazem? Ainda me lembro quando essa pergunta foi colocada ao ex-ministro Mário Lino pelo humorista Ricardo Araújo Pereira e a resposta foi claramente o mais cómico: "então uma pessoa fica com a possibilidade de escolher uma via ou escolher outra!" (ainda pensei que Mário Lino fosse soltar uma gargalhada demonstrando que tinha um excelente sentido de humor e depois fosse dar uma explicação convincente, esperei, mas nada aconteceu...). Ou seja, a resposta dos nossos governantes para o combate às crises é espalhar alcatrão pelo país em obras de utilidade questionável... Mais curioso, após 15 anos a abusar da mesma estratégia sem que esta surta qualquer efeito, ninguém pensou: "espera lá, se calhar esta não é a medida mais acertada...". Em vez disso, cada vez que a crise se agrava, lá vem mais um dos nossos iluminados "papaguear" a inovadora medida que é o reforço do investimento nas obras públicas (leia-se auto-estradas e pontes de utilidade duvidosa, nada de hospitais, escolas e pavilhões desportivos que só dão despesas e o povo não precisa disso).
Supostamente a receita é simples, conclui-se que quanto mais vias tivermos do sitio A para o sitio B, mais a nossa economia é estimulada (pelo menos entre o sitio A e B claro está). Eu não sou economista, mas diria que essa evolução não é linear, e após um X numero de alternativas para o percurso, já não se acrescenta nada ao desenvolvimento. Outra coisa que se gosta muito de espalhar é a "boa nova" da criação de emprego, e como se regozijam os Eleitos com a noticia da criação de "milhares" de empregos(?) na criação de uma nova auto-estrada... Isto parece tolo (pelo menos quando se pensa nessa afirmação) mas a verdade é que vai pegando! Ora vamos lá juntar as cabeças e reflectir nessa ultima premissa (recordo que não conheço os meandros da construção de uma auto-estrada, mas acho que podemos fazer este exercício todos juntos). Idealmente uma auto-estrada deveria iniciar-se com um estudo sobre a sua utilidade (vá, nada de começar rir, estamos a falar de coisas sérias), teremos aqui imensos funcionários públicos a estudar arduamente os melhores percursos que vão conseguir dividir aldeias e atravessar estrategicamente os terrenos extremamente valiosos de personalidades com peso na vida politica e/ou económica e que terão de ser devidamente ressarcidos (é necessária alguma arte para acertar em todos, por isso é de louvar este trabalho). De seguida teremos os estudos de impacto ambiental (este é optativo e quando imposto pela UE ou para calar alguma organização ambientalista tende a ser feito depois da obra concluída, ou, na pior das hipóteses, quando a decisão já foi tomada e não há volta a dar), aqui se calhar empregam-se uma mão cheia de especialistas que constatam pouco mais do que o obvio, até porque ninguém lhes paga para dizer que aquela obra é um atentado. Finalmente as construtoras, estamos a falar do que verdadeiramente interessa e daquilo que, na visão do estado, é o motor da nossa economia! Ora, mais uma vez a "falar de letra" diria que não se faz a obra toda em paralelo, na melhor das hipóteses vão-se fazendo uns troços. Mas enfim, vamos então admitir que temos aqui os "milhares" de empregos criados pelo Estado através das obras publicas. A análise agora passa para o plano talvez mais interessante: quem emprega e por quanto tempo? Ainda na semana passada surgiu um estudo do centro de emprego que divulgava a falta de candidatos para as ofertas na construção civil, logo, as obras criadas acabarão por ser efectuadas à custa (na sua essência) de mão de obra estrangeira (muita dela ilegal) e por um tempo muito limitado (uma auto-estrada não leva uma eternidade na sua construção e para quem lá trabalha é sempre um trabalho temporário). Por ultimo, não esquecer que os dinheiros públicos (ao contrário do que muitos acreditam) não nascem do nada e "não são de ninguém". Os dinheiros públicos "nascem" dos nossos impostos, tudo o que é feito pelo estado vem dos nossos dinheiros. Cada auto-estrada que nasce são menos escolas ou infantários que temos (que ajudariam os pais a ter alguma paz quanto à educação dos seus filhos e poderem render mais nos seus trabalhos), são menos hospitais e centros de saúde que estão disponíveis (que impedem a desertificação do interior e poupam o dinheiro das famílias nos serviços privados por não existirem serviços públicos decentes), são menos piscinas e pavilhões que se criam e que dão acesso a uma população cada vez mais sedentária de fazer exercício de uma forma acessível (em vez de estarmos limitados a ginásios dispendiosos que depois por vezes o estado comparticipa em vez de investir), são menos policias e bombeiros cada um dos quais com menos qualificações e materiais disponíveis do que deveríamos ter.

Pois é verdade, não há dinheiro para tudo! Será que o melhor é continuar cegamente a espalhar betão pelo país? Esta é uma politica que não só limita os actuais investimentos como os investimentos futuros e não só de uma forma contabilística! Onde espalhamos alcatrão não podemos explorar o potencial natural da nossa terra, onde gastamos dinheiro não temos o que gastar em politicas de fundo e nas reformas necessárias para que o nosso país possa superar as actuais e as futuras adversidades de um sistema económico mundial. Até lá temos e teremos um "país de tanga" em que a moral ainda vai sendo aguentada pelo fado, Fátima e o futebol...

Um grande bem haja,
GN

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